![]() ------------------------------------ (Grego krónos = tempo) O vocábulo «crônica» mudou de sentido ao longo   dos séculos. A princípio, designava um "relato cronológico dos   fatos", isto é, uma lista ou relação de acontecimentos, organizados   conforme a seqüência linear do tempo, ou seja, uma narração de episódios   históricos. Em termos práticos a crônica se limitava a registrar os eventos,   sem aprofundar-lhes as causas ou dar-lhes qualquer interpretação. Dentro   dessa característica a crônica atingiu seu ápice após o século XII. Porém,   nessa altura a crônica já exigia uma distinção: as que narravam   acontecimentos com abundância de pormenores, com a intenção de esclarecer ou   interpretar os acontecimentos numa perspectiva individual, recebiam o tradicional   nome de «crônica». Em contrapartida, as “crônicas breves”, isto   é, as simples e impessoais notações dos acontecimentos históricos, passaram a   denominar-se «cronicões». A partir do século   XIX, com o avanço da imprensa e do jornal, a crônica passa a ostentar estrita   personalidade literária. Assim entendida, a crônica teria sido inaugurada   pelo francês Jean Lous Geoffroym,  em  1800,  no jornal   “Des Débats” na forma de folhetim que, entre nós, apareceu depois de   1836. Não tinha, ainda, as características que tem hoje: “Era um texto mais   longo, publicado geralmente aos domingos no rodapé da primeira página do   jornal, e seu primeiro objetivo era comentar e passar em revista os   principais fatos da semana, fossem eles alegres ou tristes, sérios ou banais,   econômicos ou políticos, sociais ou culturais. O resultado, para dar um   exemplo, é que num único folhetim podiam estar, lado a lado, notícias sobre a   guerra da Criméia, uma apreciação do espetáculo lírico que acabara de   estrear, críticas às especulações na Bolsa e a descrição de um baile no   Cassino." (FARIA, João   Roberto no prefácio de Crônicas Escolhidas de José de Alencar) De lá para cá, o   prestígio da crônica não tem deixado de crescer, a ponto de haver os que a   identificam com a própria Literatura Brasileira ou a consideram nossa   exclusividade. De assunto livre,   mas geralmente voltado para os pequenos fatos do cotidiano, a crônica é o   único gênero literário produzido essencialmente para ser vinculado na   imprensa, seja nas páginas de uma revista, seja nas de um jornal. De maneira,   que ela é feita com uma finalidade pré-estabelecida: agradar aos leitores   dentro de um espaço sempre igual e com a mesma localização, criando-se assim,   no transcurso dos dias ou das semanas, uma familiaridade entre o escritor e   aqueles que o lêem. Pelo seu caráter jornalístico a crônica é efêmera e, não   raro, sobrevive ao tempo. Por isso, é que, posteriormente, são reunidas em   livro. Assim, seu autor dá-lhe um status mais perpétuo, ou mais nobre. Regra geral, a   crônica é um comentário leve e breve sobre algum fato do cotidiano. Seu   motivo, na maioria dos casos, é o pequeno acontecimento, isto é, a notícia   que ninguém prestou atenção, o acontecimento insignificante, a cena   corriqueira, trivialidades. Mas nem só de uma conversa despretensiosa a   respeito do dia-a-dia vive a crônica. Com relativa freqüência, ela se   aproxima do conto, devido a um tratamento literário mais apurado,   principalmente no que tange a linguagem. Tanto é, que, muitas vezes, é   difícil estabelecer as diferenças entre o conto e a crônica, pois, nesse   caso, dela também participam personagens; o tempo e o espaço estão claramente   definidos e um pequeno enredo é desenvolvido. Essa proximidade é que tem   levado vários cronistas à prática mais ou menos disfarçada do conto. No   entanto, esta diferenciação só é perceptível àquele com leitura contínua de   contos e de crônicas. De qualquer maneira, há certa dificuldade de se   estabelecer uma fronteira teórica entre ambos. Contudo, podemos enumerar   algumas características da crônica que podem ser confrontadas com as do   conto:  • Ligada à vida   cotidiana. Depoimento pessoal, com estilo e pontos de vista individuais.   Narrativa informal, familiar, intimista. • Uso da oralidade   na escrita = linguagem coloquial, às vezes sentimental, ou emotiva, ou ainda,   irônica, crítica. • Sensibilidade no   contato com a realidade. Natureza ensaística. Síntese, brevidade, leveza,   dose de lirismo. • Uso do fato como   meio ou pretexto para o artista exercer seu estilo e criatividade.  • Diz coisas sérias   por meio de uma aparente conversa fiada. OS VÁRIOS TIPOS DE CRÔNICA Crônica Lírica ou   Poética  Em uma linguagem   poética e metafórica o autor extravasa sua alma lírica diante de episódios   sentimentais, nostálgicos ou de simples beleza da vida urbana, significativos   para ele. Como, por exemplo, em «Brinquedos Incendiados», de Cecília   Meireles. Por vezes, esse tipo de crônica é construído em forma de versos   poéticos. Contudo, tem-se observado estar, a crônica lírica ou poética, cada   vez mais em desuso, provavelmente devido à violência e a degradação da vida   nas grandes cidades brasileiras. Crônica de Humor  Apresenta uma visão   irônica ou cômica dos fatos em forma de um comentário, ou de um relato curto.   Como em «Sessão de Hipnotismo», de Fernando Sabino. É uma crônica muito   próxima do conto. Procura basicamente o riso, com certo registro irônico dos   costumes. Crônica-Ensaio  Apesar de ser   escrita em linguagem literária; ter um espírito humorístico e valer-se,   inclusive, da ficção; este tipo de crônica apresenta uma visão abertamente   crítica da realidade cultural e ideológica de sua época, servindo para   mostrar o que autor quer ou não quer de seu país. Aproxima-se do ensaio, do   qual guarda o aspecto argumentativo. Paulo Francis e Arnaldo Jabor são dois   grandes representantes desse tipo de crônica. Como exemplo, cito: Reality   Show, de Marcelo Coelho. Crônica Descritiva  Ocorre quando uma   crônica explora a caracterização de seres animados e inanimados, num espaço   vivo, como numa pintura. Crônica Narrativa  Tem por base uma   história (às vezes, constituída só de diálogos), que pode ser narrada tanto   na 1ª quanto na 3ª pessoa do singular. Por essas características, a crônica   narrativa se aproxima do conto (por vezes até confundida com ele). É uma   crônica comprometida com fatos do cotidiano, isto é, fatos banais, comuns.   Não raro, a crônica narrativa explora a caracterização de seres. Quando isso   acontece temos a Crônica Narrativo-Descritiva. Crônica   Dissertativa  Opinião explícita,   com argumentos mais “sentimentalistas” do que “racionais” (em vez de “segundo   o IBGE a mortalidade infantil aumenta no Brasil”, seria “vejo mais uma vez   esses pequenos seres não alimentarem sequer o corpo”). Exposto tanto na 1ª   pessoa do singular quanto na do plural. Crônica Reflexiva  Reflexões   filosóficas sobre vários assuntos. Apresenta uma reflexão de alcance mais   geral a partir de um fato particular. Crônica Metafísica  Constitui-se de   reflexos filosóficos sobre a vida humana.  Cada cronista é   singular pelo estilo que apresenta. Portanto, a tentativa de classificar a   crônica deve ser vista aqui como uma sugestão para você criar seu próprio   texto. A crônica teve um   desenvolvimento específico no Brasil, não faltando historiadores literários   que lhe atribuem um caráter exclusivamente nacional. Com efeito, a crônica   como a entendemos, não é comum na imprensa de outros países. Por isso, entre   nós, o prestígio da crônica não tem deixado de crescer. Machado de Assis,   Olavo Bilac, Humberto Campos, Raquel de Queirós ou Rachel de Queiroz, Carlos   Drummond de Andrade, Rubens Braga, Paulo Mendes, Paulo Francis, Arnaldo   Jabor, Érico Veríssimo e tantos outros, cultivaram-na ou cultivam-na com   peculiar engenhosidade, criatividade e assiduidade.® __________________________________________ Ajudaram na   construção deste texto:  Eduardo Portela - Visão Prospectiva da Literatura Brasileira.  Assis Brasil - Vocabulário Técnico de Literatura  Massaud Moisés - A Criação Literária.  www.sitedeliteratura.cjb.net/ Agradeço a leitura e, antecipadamente, qualquer comentário. Se você   encontrar erros (inclusive de português), por favor, me informe.   |  
|    Ricardo Sérgio  |  
|    Publicado no Recanto das Letras em 27/12/2007 Código do texto: T794029  |