Redação
UMA BREVE ANÁLISE DE MEMÓRIAS DE UM SARGENTO DE MILÍCIAS
MEMÓRIAS DE UM BRASIL IMPERIAL
O romance Memórias de um Sargento de Milícias (1852), de Manuel Antonio de Almeida, foi escrito nos primórdios da formação literária brasileira. Figura, tal como O Filho do Pescador (1848), de Teixeira e Sousa, e A Moreninha (1844), de Joaquim Manuel de Macedo, como algumas das obras iniciais, visto que antes deles praticamente não havia uma cultura nacional narrativa.
Memórias de um Sargento de Milícias (doravante MSM) é considerado um romance pícaro, por Mario de Andrade; um romance pré-realista, para o crítico José Veríssimo; e um romance propriamente romântico com peculiaridades excêntricas, que o diverge das outras obras desta série literária, por Antonio Cândido (ALMEIDA, p. 164)
O mote maior do romance está na sua ação, centrada em personagens tipos do século XIX, o que o torna um romance de costumes. Essa ação é desenvolvida em moto contínuo, como afirma Cândido (1957, p. 215), ou seja, os fatos ou os acontecimentos de MSM são rápidos, ininterruptos e constantes, encerrando em cada pequeno capítulo uma estória dinâmica dentro da estória maior.
Tal dinamicidade pode advir, quem sabe, da forma em que foi escrito, publicado semanalmente no jornal Gazeta Mercantil, do Rio de Janeiro, em um pequeno espaço para o romance, além de ser uma forma de prender a atenção do leitor oitocentista, ainda afeito a leituras do gênero.
Dessa forma, poder-se-ia afirmar que MSM é quase um pastiche cultural da época Del-Rei Dom João VI, tempo em que a narração se desenvolve. Sendo, entretanto, uma representação de pessoas simples, comuns, não-aburguesadas: comadres, compadres, soldados, toma-largura, sacristão, viúvas, etc. Talvez por isso o livro tenha sido considerado excêntrico, visto que os sucessores passaram a abordar a vida da burguesia e da aristocracia de então, caso de José de Alencar e de Machado de Assis.
Ao mesmo tempo em que as ações acontecem em Memórias... sem que o leitor possa respirar, há com isso a criação de personagens planas (GANCHO, p. 14 a 20), sem densidade psicológica, rapidamente descritas (fisicamente), deixando as suas páginas com a característica de um romance meramente cômico, às vezes irônico, que não aprofunda ideias nem seres, somente cria risos das traquinagens morais dos dois personagens “principais”: os Leonardos, pai e filho. Isso acontece justamente porque a ação que se desenvolve, como já foi dito, é o fator principal do livro (CÂNDIDO, p. 216 a 218).
Assim, como se torna um romance raso, superficial, nunca verticalizado para uma caracterização mais densa das personagens, notadamente dos protagonistas, e da alma humana, MSM é ao mesmo tempo agradável por conter tais ações em um total de 48 capítulos, criando, renovando e instigando para as novas aventuras que vão se sucedendo praticamente a cada página.
O enredo, no entanto, intrinsecamente coeso com as ações das personagens que avultam e somem quase que a todo instante, encerra tanto a sua salvação, como a sua desdita: ser superficial, cosmético, não ter sido levado a sério à época da sua publicação e tornar-se adorado anos depois, por conter a representação, mesmo que ficcional, embora verossímil, do momento histórico retratado em suas linhas.
MSM é, hoje, um romance para aqueles que não têm tempo ou paciência para sentar e se entreter com leituras mais condensadas. Serve perfeitamente para entendermos o homem e o Brasil imperiais, além de divertir na contemporaneidade por ser leve, fluido, descontraído e sem exigir grandes malabarismos mnemônicos para o seu entendimento.
BIBLIOGRAFIA:
ALMEIDA, Manuel A. de. Memórias de um Sargento de Milícias. São Paulo: Klick Editora.
CÂNDIDO, Antonio. Manuel Antonio de Almeida: O Romance em Moto Contínuo. In.: Formação da Literatura Brasileira. São Paulo: Editora Itatiaia, 1957. P. 215 a 219.
GANCHO, Cândida Vilares. Como Analisar Narrativas. Série Princípios. São Paulo: Editora Ática, 1991.
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