Bruno: Sem dúvidas, o que mais atrai a minha atenção no livro é o universosteampunk, que para mim é um dos elementos mais fascinantes da ficção científica. É muito interessante essa questão de "imaginar o futuro a partir do passado", como se diz, imaginando como seria o nosso mundo se a tecnologia tivesse enveredado por outros caminhos possíveis. De certa forma, o steampunk é uma espécie de arqueologia da ficção científica - é imaginar como poderiam ter sido as obras especulativas se elas tivessem sido escritas 500 anos atrás.
Belas-Letras: Houve alguma dificuldade em adaptar o universo do livro? O texto tem um vocabulário bem específico da ficção-científica (como por exemplo, via vapórea). Como você adaptou esses termos para o português?
Bruno: Tradução sem dificuldade não existe. Nesse caso, acho que o mais complicado era a tradução de termos próprios ao gênero steampunk, o que exigiu bastante pesquisa. Isso foi desde os nomes para componentes de relógios até palavras que não existem nem em inglês. Parte delas eu peguei emprestada de outros livros do gênero publicados no Brasil, mas em outros casos foi necessário inventar algo, tentando recriar o caminho percorrido pelo autor para chegar àqueles termos.
Belas-Letras: E além desses termos, há um vocabulário bem rico, palavras não utilizadas no dia a dia (pelo menos na versão traduzida). Como você selecionou essas palavras?
Bruno: A riqueza de vocabulário surgiu de forma natural, porque o texto original também tem essa característica. A ficção especulativa costuma ter uma atenção especial para os detalhes, como forma de legitimar os aspectos "fantásticos" que surgem ao longo das histórias. É uma maneira de mostrar que, embora o nosso mundo não tenha a mesma estrutura que aquele universo ficcional, ele poderia ter. Acredito que seja por isso que o autor utilizou nomenclaturas referentes a peças de relógio, partes mecânicas, etc. Sem isso, a tradução não funcionaria.
Belas-Letras: Em que sentido os fãs da banda Rush poderão se identificar com a história?"É impossível que os fãs da banda não se interessem."
Bruno: Bom, o livro é inteiramente baseado no álbum Clockwork Angels, então acho que é impossível que os fãs da banda não se interessem pelo texto. O trabalho do autor em conjunto com o Neil é muito interessante porque, ao invés de simplesmente adaptar as letras do disco para transformá-las em um romance, o que eles fizeram foi reunir todos os elementos que apareciam nas canções e expandir o mundo em que eles estavam inseridos. Tenho certeza de que os fãs vão gostar muito da experiência de comparar aquilo que haviam imaginado ao ouvir o disco com a versão escrita pelo Kevin Anderson. E o fato de Neil Peart ter participado do processo contribuiu muito para isso. No posfácio do livro, o baterista do Rush conta um pouco de como foi essa experiência de trabalhar em conjunto - algo que eles já pretendiam fazer havia muitos anos, e que só se concretizou agora. E fica claro que há uma mão do Neil por trás de cada detalhe, já que ele atuou ao mesmo tempo como um co-criador e um consultor do universo do livro (que, afinal de contas, foi criado por ele). O fato dos dois terem trabalhado juntos garante que a atmosfera seja perfeitamente adequada àquela do álbum.